Reescrita do poema “O Sr. Bleaney”, de Philip Larkin (em itálico o
original):
O Sr. Bleaney
“Era este o
quarto do Sr. Bleaney. Viveu aqui
enquanto
trabalhou para a Bodies, até
que o
transferiram.” As cortinas puídas de pano às flores
caem a doze
centímetros do peitoril,
da janela vê-se
um terreno com prédios em construção,
cheio de mato e
lixo. “Era o Sr. Bleaney
quem me cuidava do
jardim, saía-se mesmo bem.”
Cama, cadeira de
pau, lâmpada de sessenta volts, nenhum cabide
atrás da porta
nem espaço para livros ou malas –
“Fico com ele”. E
assim acontece que me deito
na cama onde o
Sr. Bleaney se deitava, e apago os cigarros
no mesmo pires de
souvenir, e encho
os meus ouvidos
de algodão para não ouvir
o aparelho
palrador cuja compra sugeriu.
Conheço os seus
hábitos – a que horas descia,
a preferência por
molho que não fosse de carne, porque
fazia mal à saúde, o vagar dos seus passos, a
postura calma, o cabelo grisalho. Mas
tudo cessou: cessou o aparelho palrador, os
seus passos, a sua fala encavalitada e bruta
mas sempre doce e reconfortante. Para onde
ir agora? O que fazer? Se o Sr. Bleaney
aqui estivesse mandar-me-ia dar uma curva por
estar a ter uma espécie de crise existencial. Enfim.
Retiro o algodão dos ouvidos e vejo as horas: quatro
da tarde. Não tenho fome, nem sede, nem me apetece
sair. Tenho tempo para pensar mas não o faço. Em
vez disso atiro-me para a cama e para um sono profundo.
Teresa R.
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